domingo, 18 de outubro de 2009

Polícia Comunitária: uma nova filosofia de trabalho ou nova ideologia de Segurança Pública?

Por Sebastião Uchoa

Há uma série de questionamentos técnico, filosófico, sociológico e/ou antropológico do que vem a ser efetivamente o paradigma “Policia Comunitária”, tanto internamente nos órgãos de segurança pública (para os críticos e até passivos, obviamente) como externo, ou seja, para a própria sociedade que se dispersa em inúmeras interpretações com pontos de resistências ou acolhimento da possível, louvável e ousada proposta nacional em andamento a cargo da Secretaria Nacional de Segurança Pública – SENASP/MJ por meio dos cursos Nacional de Multiplicador de Policia Comunitária e até mesmo o de Promotores de Policia Comunitária no âmbito das organizações policiais estaduais no Brasil nesses últimos anos.E me parece que está fazendo um bom efeito, é só olharmos as inúmeras posturas inovadoras por que vêm adotando as instituições policiais no período de 2002 para cá.
Para os tradicionalistas e corporativistas “seculares” das corporações policiais brasileira, trata-se de uma modalidade de se “fazer policia”, talvez “perdendo espaço” em detrimento da participação efetiva da sociedade ou comunidade local nas estratégias de se realizarem os serviços públicos de segurança, ante os trabalhos eminentemente técnico dos profissionais de segurança pública que, a seu ver, “são os únicos detentores desses saberes” e possuem o monopólio do poder de policia, face a representação do “Leviatã” (Estado), está por trás de todas as ações desenvolvidas nas mais diversas atividade do Estado enquanto prestador único dessa modalidade de serviço público, sobretudo porque “detêm o poder-dever do uso exclusivo da força”, legitimamente reconhecido e delegado pelas leis do país.
Enquanto os tradicionalistas mantêm-se reféns de um vínculo de atividade funcional do passado sobre o presente, há os denominados progressistas que, dentro de uma visão sistêmica do problema, calcada na necessidade de ações multidisciplinares para com o enfrentamento integrado da problemática inerente a criminalidade violenta urbana, encontram respostas científicas e extremamente convencedoras a luz do rompimento da visão fragmentada, reducionista e pragmática que são tão presentes nas abordagens e respostas convencionais por que têm ainda se mantido as ações policiais de diversas organizações de segurança pública nesse país afora, notadamente na insistência da manutenção dos denominados paradigmas do passado com roupagens diferentes nas ações do presente, já que dentre vários princípios norteadores da denominada Policia Comunitária, estão os de não se confundir com condescendência criminal, muito menos com um relativismo exagerado onde o Estado se absterá de suas ações típicas para com a manutenção da paz e ordem social correspondentes, mas por meios de mudanças das estratégias decorrentes face uma participação efetiva e indireta da sociedade para com o enfrentamento dos problemas que podem gerar criminalidade em suas respectivas áreas de abrangência.
O certo é que se faz necessário destrinchar se a propalada “Policia Comunitária” se se trata mesmo de uma filosofia de trabalho com vista a inovar os procedimentos organizacionais formais e informais de respostas à criminalidade objetivando-os à prevenção e manutenção da ordem social no contexto societário brasileiro mediante participação integrada da comunidade, ou se é mais uma ideologia que esconde as causas reais da criminalidade levando para as polícias mais responsabilidade ou usurpação de competência dos demais órgãos públicos e privados que têm responsabilidade na produção de políticas públicas sociais correspondentes, e muito, o dever de cumprirem com suas respectivas obrigações sociais para com enfrentamento da questão correlata a violência criminal na sociedade brasileira, sobretudo quando se pretende produzir estratégias junto às denominadas comunidades de risco (pobres material e culturalmente), objetivando, de forma integrada, “encontrarem” saídas para os problemas que lhes afligem e lhes tiram a paz social, principalmente revelada nas ações criminosas oriundas, muitas vezes, da completa ausência do Estado e sociedade civil para com as garantias mínimas de sociabilidade dos que vivem e sobrevivem naqueles contextos de profunda opressão social, conforme razões já expostas.
Ou seja, é preciso descortinar, talvez, que, muitas vezes, mesmo que o policial comunitário (o trabalhador de segurança pública “filosoficamente preparado” ou capacitado para li dar com os problemas da comunidade a qual presta seu serviço) se torne um facilitador ou mediador para resolução de determinados problemas sociais que contribuem diretamente ou indiretamente com violência criminal, com certeza, tão pouco atingirá o cerne precípuo da problemática que, dentre várias resoluções das incógnitas equacionais, encontramos o câncer da concentração de renda no país que, de forma sanguinária, promove uma série de atentados à dignidade da pessoa humana, mais precisamente dos que sobrevivem marginalizados nos mundos periféricos de uma sociedade apática e eminentemente projetadora dos seus problemas aos “destinos da vida” ou “a si mesma” como únicos responsáveis pelos problemas por que está passando, já que a amarra da ignorância em estágio de acefalia política, é de extrema presença ainda no subconsciente social brasileiro, basta folhearmos a biografia dos nossos mais genuínos representante políticos que, além de perpetuarem na falsa representação social, lutam e relutam utilizando de estratégias mesquinhas para que a massa dos desprovidos não possa se libertar internamente da inovada escravidão social, que se revela no demasiado analfabetismo político do nosso povo nesses tempos ditos globalizados.
O mais interessante, dentre outras vertentes, que sendo uma nova filosofia de trabalho ou ideologia de afirmação, com o modelo de Policia Comunitária tomando-se corpo nesse imenso Brasil afora, torna-se uma grande possibilidade para que os órgãos de segurança pública comecem a reagir democraticamente e passem a se relegitimar perante a sociedade, mediante um verdadeiro resgate de sua importância histórica, quiçá milenar, principalmente dentro de um Estado que tenha como desenho estrutural o modelo de ser “Democrático e de Direito” (mesmo que estejamos realisticamente longe desse estágio).
Assim, as forças policiais, integrando-se com a sociedade, começarão a transmitir para esta o quanto são de vitalidade ímpar para a manutenção da preservação da ordem pública social, sem os arquétipos das famosas repressões desqualificadas (ações inconseqüentes, sem mensuração de ordem social, mas pragmáticas), cujas máculas até hoje se recolhe de um passado presente com estigmas que precisam estripados de seus meios, até atingir o tecido social via de conseqüência, da qual se destina unicamente a modalidade específica e importante da função pública que é de servir a sociedade de forma incondicional através da função policial nas suas mais diversas manifestações de prestação de serviço público, respeitadas, obviamente as especificidades dos órgãos policiais diretos e indiretos com suas respectivas missões, mediante ações de verdadeiras pró-atividades em detrimento da denominada reação inconsciente e inconseqüente que temos assistidos nos mais diversos modelos de gestão de policia que ainda insistem repetir os erros do passado no presente, em vários estados da federação brasileira. Onde os entendendo que a "desordem pública é produto da ausência de repressão", mergulham num estado de ignorância ao achar que tudo se resolve por ser “questão simples e objetivamente de Policia” na acepção mais simplória possível. Mas quem sabe de Polícia protetiva ao invés de repressiva num desenho do famoso “Estado mínimo versus cidadania máxima”? Só o tempo que nos asseverará com firmeza se a caminhada certa seja a passada inicial levada a efeito pela implantação da Policia comunitária e seus desdobramentos no por vir. E até lá, somente especulações e sonhos serão os desenhos maiores a serem interpretados.
Obs: Publicado no Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 20/10/2009 com alguns comentários ali esposados.
Sebastião Uchoa – Delegado de Policia Civil/Maranhão, membro da Diretoria Executiva da Associação dos Delegados de Policia Civil do Maranhão, uchoa39@yahoo.com.br

2 comentários:

  1. Uchôa, caro amigo:

    o seu texto sobre meus trabalhos publicados em jornal foi como um incentivo de permanência para mim. sei que já é tarde deixar este registro, contudo, muito obrigado. vou continuar fazendo a minha parte, ou seja, denunciando os maus tratos contra o meio-ambiente, os seres humanos e tudo que me interesse em favor da humanidade. proximamente escreverei para você, com mais assuntos e fervor verbal. aceite meu abraço. almir.

    ResponderExcluir
  2. Amigo,

    a missão está definida, a estratégia determinada, o planejamento efetivado e a tática são homens com a sua envergadura e comando que aplicam, fico feliz com sua trajetória, lembre-se sempre: "Para que o mal triunfe, basta que os bons se omitam."

    Forte abraço,

    Carlos Manoel.

    ResponderExcluir